Justiça paulista proíbe uso de decote

Homens e mulheres poderão ser barrados na entrada do Fórum Regional de Santana, em São Paulo, se estiverem usando roupas consideradas inadequadas. Uma portaria publicada pela diretoria do fórum proíbe as mulheres de ingressarem com “decotes profundos a ponto de deixarem mais da metade do colo dos seios visíveis” ou roupas “transparentes a ponto de permitir entrever-se partes do corpo ou de peças íntimas”. Os homens não podem usar “camiseta com gola U ou V que deixe mais da metade do tórax exposto”.

A norma, que será afixada nas dependências do órgão, descreve detalhadamente o que não será tolerado, como blusas sem alças e saias que não cubram dois terços das coxas, além de shorts ou bermudas. Ainda proíbe o ingresso de pessoas descalças ou que apresentem péssimas condições de higiene.

O fórum não é o único que dispõe de regras sobre como se vestir. Unidades nos municípios de Jandira (SP) e Londrina (PR) já têm normas semelhantes. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) também barram pessoas com roupas consideradas inadequadas. Porém, advogados temem que, em alguns casos, essas regras acabem limitando o acesso de pessoas carentes.

As regras do Fórum Regional de Santana passam a valer a partir do dia 13. A norma, no entanto, estabelece que os juízes do fórum poderão autorizar a entrada de jurisdicionados que tenham de se dirigir a audiências ou a sessões do Tribunal do Júri e que estejam vestidos em desconformidade com os termos da portaria.

Para a advogada Karen Badaró Viero, sócia do Marcelo Tostes Advogados, a regulamentação é necessária e condizente com a atividade mais formal exercida. Porém, ela ressalta que a portaria tem um viés temerário na medida que será aplicada em varas cíveis e criminais, localizadas em uma região que concentra uma grande população de baixa renda. “Isso pode gerar um certo incômodo”, diz.

O advogado Tiago de Lima Almeida, sócio do Celso Cordeiro de Almeida e Silva Advogados, porém, afirma que a portaria não pode ser considerada ilegal, uma vez que prevê a entrada de pessoas indevidamente trajadas em casos excepcionais. Ele afirma, que assim como os tribunais superiores, o fórum pode regulamentar o tema dentro do bom senso e da razoabilidade, desde que não estabeleça regras rígidas, para não aparentar discriminação.

O juiz diretor do Fórum Regional de Santana, Maurício Campos da Silva Velho, esclareceu, por meio de nota, que o tema foi genericamente tratado pelo Provimento nº 603, de 1998, do Conselho Superior da Magistratura. O provimento diz que nas dependências de fóruns, as pessoas deverão apresentar-se convenientemente trajadas, segundo sua condição social.

No caso do Fórum de Santana, como não havia nenhuma portaria sobre o tema, os agentes de fiscalização e os seguranças terceirizados eram “constantemente interpelados por usuários barrados na entrada do prédio por se acharem usando bermudas, camisetas regata, microssaias e roupas transparentes sobre a norma específica em que se baseavam para tal restrição”, segundo o juiz. Por isso, a necessidade de edição da norma.

Uma portaria com esse teor, editada pela direção da Comarca de Vilhena, em Rondônia, foi validada, por maioria, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2009. O relator, conselheiro João Oreste Dalazen, entendeu não haver ilegalidade na portaria que impede a entrada nas dependências do fórum de pessoas com trajes considerados inadequados, como calção, short e bermudão. Para o conselheiro, não há empecilhos para a edição de portarias dessa natureza, se não for rígida e admitir exceções em casos de urgência ou de impossibilidade financeira de a parte vestir-se de outro modo. Segundo a decisão, “a Constituição veda a discriminação arbitrária, não o tratamento diferenciado ditado pela razoabilidade e justificado pelo padrão médio de moralidade da sociedade”.

Adriana Aguiar – São Paulo

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